As ilhas Ashmore e Cartier, pequenos territórios de coral australianos no coração do Oceano Índico, estão a tornar-se laboratórios vivos para a preservação de ecossistemas marinhos. Usando inteligência artificial (IA), sistemas de informação geográfica (GIS), robótica autónoma e ciência cidadã, a Austrália enfrenta os desafios da mudança climática e da pressão humana nestes frágeis recifes. Neste artigo, exploramos como estas inovações estão a transformar a conservação ambiental numa região remota, mas estratégica, e o seu potencial para inspirar soluções globais.
Um Refúgio Ameaçado no Oceano Índico
Localizadas a 300 km da costa noroeste da Austrália e a pouco mais de 100 km da ilha indonésia de Roti, as ilhas Ashmore e Cartier são faixas de areia e coral rodeadas por águas turquesa. Declaradas parque nacional (Ashmore, em 1983) e reserva marinha (Cartier, em 2000), estas áreas têm acesso rigorosamente controlado. Apenas pescadores tradicionais indonésios, sob um memorando de 1974, podem visitar a Ilha Oeste de Ashmore para obter água potável, visitar túmulos ancestrais ou procurar abrigo.
Apesar do isolamento, estas ilhas enfrentam ameaças crescentes. Em agosto de 2025, investigadores australianos confirmaram que a costa noroeste do país sofreu o mais longo e intenso aquecimento oceânico registado, causando perdas massivas de corais ao longo de 1.500 km, incluindo o recife de Ashmore. A mudança climática, com ondas de calor marinhas, prova que nem os locais mais remotos estão imunes.
Inovações Tecnológicas na Linha da Frente
Para proteger estas ilhas, a Austrália combina regulamentação rigorosa com tecnologia de ponta. Até 2030, o governo planeia classificar um terço das suas águas nacionais como “estritamente protegidas”, proibindo mineração, pesca industrial e perfuração. Para tornar esta meta realidade, tecnologias inteligentes estão a ser implementadas:
- Inteligência Artificial e GIS: Satélites e algoritmos de IA mapeiam o fundo do mar, identificando habitats sensíveis e sinais de stress nos corais. Ferramentas como o BenthoBox, desenvolvido pelo Instituto Australiano de Ciências Marinhas, analisam milhares de imagens subaquáticas para identificar espécies com precisão.
- Robótica Autónoma: Sistemas robóticos libertam larvas de corais em áreas danificadas, acelerando a recuperação natural numa escala impossível para intervenções manuais.
- Sensores Subaquáticos: Equipados com algoritmos de reconhecimento em tempo real, monitorizam a qualidade da água e detetam espécies invasoras, como a estrela-do-mar coroa-de-espinhos, permitindo respostas rápidas.
- Ciência Cidadã e Conhecimento Indígena: Programas como o dos guardiões Bardi Jawi integram observações locais com modelos estatísticos avançados, unindo ciência e cultura para avaliar a saúde dos recifes.
Estas tecnologias não só protegem os ecossistemas, mas também criam um modelo replicável para outras regiões vulneráveis, como os recifes das Maldivas ou da Polinésia Francesa.
Uma Abordagem Integrada
A combinação de ciência, tecnologia e conhecimento tradicional é fundamental. Hugh Possingham, biólogo conservacionista e membro da Royal Society, destaca: “A proteção eficaz de áreas remotas exige planeamento sistemático apoiado por ferramentas preditivas. A integração de GIS, IA e modelos de conservação permite criar redes marinhas coerentes a nível global.” Imogen Zethoven, ativista do Grande Recife de Coral, reforça: “As tecnologias digitais e a participação comunitária são a energia que sustenta as zonas de conservação hoje. Sem elas, até os refúgios mais remotos correm risco.”
Os recifes de Ashmore e Cartier, com oito áreas protegidas (seis em Ashmore e duas em Cartier), são monitorizados por satélites, sensores e guardiões locais, formando parte de uma rede de conservação que a Austrália pretende fortalecer até 2030.
Um Laboratório Vivo para o Futuro
As ilhas Ashmore e Cartier são mais do que reservas naturais; são laboratórios vivos para testar soluções contra os desafios climáticos. A sua localização estratégica, entre a Austrália e a Indonésia, torna-as um ponto crucial para a biodiversidade marinha, abrigando aves migratórias e vegetação espontânea que resiste a condições extremas. A abordagem australiana, que combina proteção legal, inovação tecnológica e envolvimento comunitário, oferece um modelo promissor para a conservação global.
Olhando para o futuro, estas ilhas podem inspirar estratégias de preservação em ecossistemas frágeis em todo o mundo. A meta australiana de proteger um terço dos seus oceanos até 2030 reflete um compromisso ambicioso. Se bem-sucedida, esta iniciativa garantirá que Ashmore e Cartier continuem a ser oásis de biodiversidade, provando que ciência e tradição podem trabalhar juntas para enfrentar as mudanças climáticas.